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O guarda-tempo

O guarda-tempo
O guarda-tempo

O GUARDA-TEMPO
Angela Leite
Ilustrações:
Mariette Menezes

Editora Formato
Infanto – Juvenil
2008

A AUTORA:
Foram meus três filhos que me motivaram a escrever para crianças. Depois de já ter publicado oito livros para adultos, descobri que não tinha ainda escrito nada que eles pudessem compreender e amar, como amavam, por exemplo, os poemas de Ou isto ou aquilo, de Cecília Meireles. Esse ciúme foi responsável pelos quase quarenta livros que até hoje produzi para o público infanto-juvenil

Além de escrever, percebi que podia pôr em prática o gosto que sempre tive pelo desenho e me tornei também ilustradora – de meus próprios textos e dos de outros autores. Escrevendo ou ilustrando, o prazer é o mesmo: posso usar minha imaginação à vontade.

A maior parte dos meus livros nasceu de experiências e brincadeiras que vivi na infância.

Este O guarda-tempo conta histórias de quatro gerações de minha família, e nele estão misturados acontecimentos reais e invenções de escritora – um pouco para dar mais graça e sabor à realidade, um pouco porque a memória, mesmo quando se esforça para guardar o tempo, não resiste à tentação de mudar alguma coisa…

Angela Leite de Souza

SINOPSE:

Crianças de diferentes épocas se “encontram” misteriosamente dentro de um armário que pertence à família há vários anos. Sentem que se conhecem, mas não sabem de onde (ou de quando…). O mistério não é desvendado, mas durante quatro gerações elas vivem situações engraçadas, ou tristes, ou estranhas, enquanto o tempo passa e o mundo se modifica – dentro e fora do armário.

UM POUQUINHO DO TEXTO DO LIVRO

O Esconderijo
– Desce já daí, menino! É de crer uma coisa dessas? Ah, mas quando eu pilhar esse biltre cá embaixo, ele vai ver só com quantos paus se faz uma canoa! Ah, vai!

Encarapitado lá em cima do imenso armário de jacarandá, Nelson até podia imaginar a mãe, do alto de seu um metro e cinqüenta, chinelo na mão, olhando furiosa para o topo do móvel, para onde, com certeza, o filho endiabrado tinha mais uma vez escapulido. Ele mal se atrevia a respirar.
Sabe-se lá se ela resolve subir até ali?

“Também”, pensava Nelson, “roubar manga do vizinho não é caso para tanto escarcéu! E elas são tão mais gostosas que as daqui de casa!…”

Dona Amélia é que não queria saber, pois seu Francisco, que morava na esquina, já tinha ido várias vezes reclamar:

– Dê um jeito nesse capetinha, comadre, não há quem agüente! Assim, ele acaba desvalorizando o quarteirão!
– Eu bem que tenho pelejado para pôr o danadinho nos trilhos, mas ele é buliçoso demais! – retrucava dona Amélia, suspirando.

A idéia de se refugiar no armário tinha surgido, sem querer, num dia em que a mãe conseguira correr mais depressa, chegando a agarrá-lo pelo braço. Mas o menino desvencilhou-se: apenas ficaram na pele quatro doloridas marcas de unhas. Rápido como um corisco, ele correu para a sala e, não encontrando saída, escalou o grande guarda-louça com a destreza de um gato. Uma vez lá em cima, descobriu que estava no mais perfeito dos esconderijos: o teto do armário era mais fundo que suas portas e laterais.

Assim, bastava deitar-se para ficar completamente oculto pela borda, que formava uma “paredinha” com mais ou menos um palmo de altura.